Para o sueco Per Olov Svedlund, presidente da fabricante de caminhões Scania na América Latina, há apenas um método eficiente para prever a evolução do mercado de veículos pesados: acompanhar o crescimento do Produto Interno Bruto. “Se o PIB vai bem, o setor vai bem”, diz Svedlund, que mora no Brasil há quatro anos, mas já passou por aqui no começo dos anos 1990. “No momento, estamos mal.” De fato, segundo os dados mais recentes da Anfavea, entidade que representa as montadoras de veículos, de janeiro a setembro foram emplacados pouco mais de 54 mil caminhões no País, uma queda de 37,6% em comparação ao mesmo período do ano passado.
A perspectiva de melhora do cenário, segundo o executivo, é zero. Isso não significa, no entanto, que a Scania está parada. Na verdade, a empresa, que chegou por aqui há mais de quatro décadas, está atualizando sua produção. Já no primeiro semestre do ano que vem, ela passará a produzir em sua fábrica em São Bernardo do Campo, no ABC paulista, motores e caminhões compatíveis com o padrão Euro 6, o mais avançado e rígido regulamento de emissões de gases poluentes em vigor no mundo, adotado, por enquanto, apenas na Europa e em um punhado de outros países.
A razão para esse movimento é o mercado externo. Com três fábricas no mundo, na Suécia, na Holanda e no Brasil, a empresa está ajustando seu processo produtivo para direcionar os produtos aos mercados em ascensão. O Brasil não deve adotar o padrão Euro 6 tão cedo. Na verdade, o Euro 5 entrou em vigor há apenas dois anos. Mas o cenário exige da Scania um posicionamento diferente. Suas vendas caíram 62,7% este ano, para 3,8 mil unidades. O fraco desempenho no Brasil jogou para baixo o número global de pedidos, que teve um declínio de 12%.
Nada que parece preocupar Svedlund. “O bom de termos fábricas padronizadas no mundo é que podemos direcionar nossa produção”, afirma. As fábricas europeias vão passar a suprir exclusivamente a demanda do velho continente, deixando a planta brasileira a cargo do restante do mundo, em especial os mercados latino-americanos e asiáticos. É na Ásia, por sinal, que o Euro 6 nacional deve aportar primeiro. Singapura, por exemplo, já colocou uma data para adotar o padrão: 2017. “Sempre que nos antecipamos à legislação obtemos bons resultados”, diz Svedlund.
“Foi assim no Brasil com o Euro 5, por exemplo, que lançamos um ano antes.” Em 2013, quando a Scania bateu recordes de vendas, o Brasil absorvia 80% de sua produção local. Esse porcentual caiu para 50% no começo do ano e deve chegar a 30% até dezembro. A notícia de que a fabrica brasileira irá começar a produzir o Euro 6 ainda trouxe otimismo aos funcionários, que estão apreensivo em virtude de notícias de demissões em outras montadoras – a Scania não fez cortes, mas deve dar férias de cinco semanas aos operários a partir do natal.
O motor, que ilustra a foto maior dessa reportagem, foi eleito para ser a estrela do calendário 2016 que a montadora produz como brinde. A réplica exposta na fábrica é frequentemente usada como cenário para funcionários tirarem selfies, orgulhosos. A reportagem da DINHEIRO presenciou ao menos três vezes a cena, nos cerca de 40 minutos em que esteve visitando a linha de montagem. Há outro motivo para a Scania antecipar a produção do Euro 6 no País. A empresa acredita que o uso de combustíveis fósseis está com os dias contados. Isso se deve ao fato de que a tecnologia para abandonar o diesel já existe. “O uso de combustíveis alternativos não é uma questão tecnológica, mas sim de cunho político”, diz Svedlund.
Todos os caminhões da companhia já saem de fábrica prontos para serem abastecidos com biodiesel, por exemplo. “Não há diferença, para nós, se vamos fabricar um caminhão movido a diesel, biodiesel, etanol, gás, ou qualquer outro combustível”, afirma o executivo. “O trabalho é o mesmo.” Para ele, o desafio está na infraestrutura. É o governo que precisa escolher se quer continuar a incentivar o uso do petróleo, ou garantir as bases para o crescimento de soluções renováveis. “O Brasil tem todas as condições de liderar esse processo, graças à cana-de-açúcar e ao etanol. É uma questão de escolha”, diz Svedlund.
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